sábado, 18 de julho de 2009

Como uma tempestade em alto Mar

O metal é um gênero pouco excitante, previsível, seguidor de doutrinas rígidas que, quando quebradas, costumam gerar procelas, grandes comoções entre fãs - os mais xiitas da música. Sendo assim, embora o metal se manifeste em diversas formas - diferentes ou não - com categorias das mais variadas que, no fim, parecem designar coisas parecidas e, na sua maioria, insossas, ultrapassadas e pouquissimo excitantes, ele, o metal, sempre perambulou perigosamente pela mesmice insípida, empolgando gerações e mais gerações de moleques que cresceriam tendo no gênero a coisa mais próxima de uma religião em suas vidas, levando tão à sério as doutrinas e cabrestos estilísticos que se torna perigoso até um parágrafo como esse.

Porém, justiça há de ser feita; mesmo sendo o metal um estilo bastante rígido, existem bandas que ousam transpor certas barreiras e são essas que, normalmente, merecem os elogios, os holofotes. Alguns discos tomaram o gênero de surpresa, tiveram grande impacto, como Kill 'em All, do Metallica, e Overkill do Motörhead antes dele. Como com o Black Sabbath, da banda de mesmo nome e, antes dele Vincebus Eruptum, do Blue Cheer. A lista é grande: Sad Wings of Destiny, do Judas Priest, Killers, do Iron Maiden, Peace Sells... But Who's Buying, do Megadeth, Bonded by Blood, do Exodus, Among the Living, do Anthrax, Reign in Blood, do Slayer, Scum, do Napalm Death, The Real Thing, do Faith No More, Meantime, do Helmet, Shape of Punk to Come, do Refused... todos esses, à seu tempo, inovadores do metal, que, de uma forma ou de outra, pavimentaram caminhos que seriam seguidos por uma vasta massa de músicos competentes, porém sem inspiração.

Misturando duas ou mais das bandas acima consegue-se entender tudo que aconteceu nas últimas décadas do metal em geral, do hair metal, ao grindcore, do black ao new metal, do crust ao stoner. E foi levando à últimas consequências a receita de algumas dessas que surgiu o gênero no qual se encaixa a banda, o disco, que esse texto tenta falar. O sludge metal, como o nome sugere, é uma espécie muito lenta, pesada e densa de metal. Espelhando-se musicalmente nas águas de fontes como o Black Sabbath, mas emprestando, muitas vezes, seu vocal do death metal (ou do hardcore), o sludge criou um tipo de metal diferente, que não empolga pela velocidade, mas pela ambiência, que se permite composições longas no lugar da objetividade do metal mais pesado, sem, no entanto, esbarrar no virtuosismo desamparado de outros gêneros, o sludge, enfim, parece que, diferente de outros tipos de metal, tem seu foco nas próprias músicas, e não na impressão que causarão no ouvinte.

Um dos discos mais interessantes e amplos do gênero existe sob o nome de Oceanic, vindo de uma banda chamada ISIS. O quarto disco na história da banda, Oceanic marca o ponto mais alto da carreira do grupo, e também o mais bem balanceado entre peso, ambiência, tons, timbres e agressão. Suas nove músicas, que se extendem por pouco mais de uma hora, variam entre breves paisagens sonoras de 3, 4 minutos, e tormentas oceânicas (trocadilho intencional, obviamente) de 9, 10 minutos. Porém, não se enganem, mesmo em momentos pesados e gritados, a dinâmica pode mudar, trocando a distorção saturada das guitarras por um som limpo, sereno, a calmaria pós tempestade, mas ainda delineada por nuvens carregadas à distância.

Oceanic traz tanto de Black Sabbath, Earth, Neurosis, Godflesh e Melvins quanto de Mogwai e Slint. Os discos anteriores à ele mostram um Isis mais focado na parte agressiva de seu som, assim como os posteriores evidenciam a banda concentrando-se mais nas sutilezas, por isso ele, especificamente, funciona como um verdadeiro divisor de águas e é, sem dúvida, o ponto culminante da carreira do grupo, sendo sua grande qualidade o equilíbrio perfeito entre as sutilezas e a agressão, como uma mão que alterna entre afagos e repreensões.

Há uma certa concordância de que um dos elos mais frágeis de qualquer forma de metal são as letras, mas até mesmo nesse aspecto Isis consegue se diferenciar de seus comparsas, no disco em questão, as letras revolvem sempre em torno de temas ligados à natureza, mas não de uma forma meramente telúrica hippie, mas sim aproveitando-se do tema para construir algumas narrativas sombrias:

"Long you both laid in the sun's yellow stare
On the edge with eyes rolled back the waves were calling him

As he teetered on the edge
The waves were calling him

He had seen it, felt its might, bent under

Washing away
He thinks of you
Everything slows
Light flashing through

The water flies
Over his head
You are me now
As you lay on my bed [...] "

Não apenas há trabalho na concepção musical de cada faixa do disco, mas as palavras parecem escolhidas da mesma forma que os acordes, com preciosismo, alternando entre imagens belas e outras perversas.

"In this secret way
He knew you first

And from those lips, a seed

Your mouth dropped open
Darkness fell out

Kept close in skin
Kept close in blood
And in he was

And from those lips, a seed

This is the gift that he received
Twisted roots kept warm

Rape she was and ready for the death"

Oceanic é uma das grandes obras do metal, e é justamente tão bom por não se deixar prender por amarras estilísticas, é um disco para ser ouvido do começo ao fim, sem pular uma música, sem perder um só segundo, pois isso tiraria da experiência final, da sensação que se tem ao término de suas músicas, que é parecida com a que se tem ao encarar o mar sumindo à distância ao morrer do dia, a eterna promessa de coisas grandiosas além de onde o céu encontra as águas.


ISIS - Oceanic









01 - The Beginning and the End

02 - The Other

03 - False Light

04 - Carry

05 - (sem nome)

06 - Maritime

07 - Weight

08 - From Sinking

09 - Hymn